(texto produzido para a orelha do livro Dez mitos sobre Israel, de Ilan Pappe)

É um estranho mistério esse que perdura há décadas: como uma injustiça extrema se realiza, dia após dia, à vista de todos, mas poucos conseguem ver? A tragédia do povo palestino, arquitetada cuidadosamente e implementada com maestria por Israel, ainda que denunciada facilmente em seus detalhes mais evidentes, permanece invisível para muitos.

É verdade que uma narrativa só tem força para invisibilizar males como a limpeza étnica e o apartheid se puder encontrar em homens e mulheres a capacidade para a naturalização acrítica dos mitos que lhes são apresentados como verdades. Pois assim é, a naturalização vem se somar à sofisticação do edifício narrativo.

Antes de podermos enxergar a injustiça é preciso desafiar os mitos que nos cegam. É preciso substituir os mitos pela verdade histórica. É isso que faz Ilan Pappe de modo magistral. Ele, que talvez seja o mais autorizado dos historiadores da Questão Palestina, aquele a quem Edward Said qualificou como o “mais eloquente” desses historiadores, ataca o problema vital com perfeita clareza e com o que eu chamaria de uma “calma” exemplar e necessária.

Dez mitos sobre Israel é um livro corajoso, e extremamente inteligente, que busca justamente sacudir as fundações dessa muralha, ou dessa cortina de fumaça, que cerca e esconde a dura realidade, enfrentando os elementos fundacionais de uma narrativa cuja força é formidável, de uma mitologia que conseguiu penetrar fundo suas raízes.

Um a um, ele faz sucumbirem os mitos do povo sem terra, da terra sem povo, da equivalência entre sionismo e judaísmo, da negação do caráter colonial do projeto sionista, da saída voluntária dos palestinos da terra em 1948, da inevitabilidade da guerra de 1967, da pretensa democracia israelense. Põe igualmente abaixo os mitos em torno de Oslo, de Gaza e da possibilidade, ainda, de uma solução de dois Estados.

A edição brasileira vem com um prefácio especial em que Pappe lida com a atualidade da Questão Palestina.

Dez mitos sobre Israel é talvez o melhor livro para se iniciar a compreensão desse drama tão central na história recente e dessa tragédia que tão fortemente desafia a nossa própria humanidade.

Este pode não ser o livro definitivo, mas é o livro indispensável.

Salem Hikmat Nasser

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